segunda-feira, junho 11, 2007

UM CONTO, DE VEZ EM QUANDO...

MÉXICO
(Hacienda Plenitud - Dos Águas - Cuernavaca)

Tenho na memória, memórias duma terra quente de cores ocres, amarelas e vermelhas, densa de gente e vegetação nalguns lugares e rala de vegetação e gente noutros, nos mais altos, onde há neves e crateras-lagos, que mesmo no inverno conservam a água quente.

Memórias de gente de pele cor de terra e olhos cor de noite com estrelas, que ama as serenatas e usa poncho e sombrero.

Duma terra onde as mulheres são belas e insinuantes e onde os homens cultivam o macho primitivismo adoçado pelo amor, desde sempre escrito e descrito nos livros e nas histórias contadas aos serões.

Duma terra, Pátria de adoradores do Sol, onde a coragem se transforma em romântica aventura a provocar suspiros de prazer e desejo em jovens sonhadoras (es) que anseiam o regresso de Pancho Villa e sonham com Zorro, cobatente do mal e defensor dos fracos e oprimidos.

Duma terra de muitos cambiantes de cores e sentimentos, que nos faz correr mais lesto o sangue nas veias.

Tenho na memória, memórias de tranças negras e olhos negros, brilhantes, de lábios como cerejas, abertos num sorriso suave e doce e dum colo quente e macio, abrigo seguro de tavessuras da infância. O colo maternal de Yula, a minha Nana de pele ambarina, longas pestanas negras e peito farto, onde eu e mais alguns sugamos a vida.

Yula, era um magnífico exemplar de Mulher Mexicana, sempre de saia longa e blusa larga, de xaile pelos ombros no dia a dia e bela mantilha de renda em dias de festa, sempre presente, sempre atenta às minhas mais insignificantes necessidades.

Apesar de não saber ler nem escrever, era grande na sua sabedoria e enorme no seu conhecimento da natureza, incluindo a humana.

Desde a minha mais tenra infância cultivei a sensação, quase certeza, de ser ela a Madona morena do Altar Mor da Igreja do Povoado, tal a ternura no olhar, a doçura no sorriso, o jeito composto do xaile ou da mantilha e a serenidade do rosto.

Yula, sabia ser doce e forte ao mesmo tempo; capaz de fechar os olhos a qualquer traquinice ou de proibir e sustar qualquer ímpeto que achasse impróprio, apenas com o seu olhar de ébano, que poderia ser de gelo ou de fogo,consoante o momento.

A minha Nana, partiu há já muitos anos para a Morada dos Espíritos, de que de vez em quando me falava, quando o tempo era infinito, eu desconhecia a cidade grande e a histórias começavam invariavelmente por - "Era uma vez!..." - Já lá vão tantos anos!

Depois, depois tudo mudou e foi ficando longe, muito longe, apenas memórias, duma terra de cores ocres, que eu guardei religiosamente e mais tarde passei para este meu caderno.



Maria Mamede

(In "Caderno de Memórias")

7 Comments:

Anonymous Anónimo said...

Ena, ena!
Um beijo,
Rosa

6:32 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Quantos cadernos para tantas memórias de tantas vidas, hã?
Bjo, Syl

10:17 da tarde  
Blogger jorge esteves said...

Umas belas páginas, estas, amiga!...
Abraços!

4:07 da tarde  
Blogger Cusco said...

Olá! Gostei imenso desta bela descrição e das imagens aqui retratadas!



Um abraço!

11:20 da manhã  
Blogger Isamar said...

Dá-nos "um conto de vez em quando..." Mamede!Gostei tanto da viagem que as tuas memórias me proporcionaram.Terras com gente quente, doce, amiga...
Beijinhos amiguinha. Que estejas completamente recuperada é o que te desejo.Saúde!

7:42 da manhã  
Blogger Filoxera said...

Viajei por enredos da Isabel Allende enquanto lia este conto. Não fica aquém das obras desta chilena, uma das minhas autoras preferidas.
Aguardo mais passaportes...

12:17 da manhã  
Blogger De Amor e de Terra said...

Olá Amiga, mas que grande elogio que me faz!!!
Agradeço muito isso que me diz, embora, sem falsa modéstia, me não ache ao nível dela...
no entanto, do pouco a que me atrevi na Prosa, um dia destes porei alo mais por cá.

Um beijo enorme a a gratidão da

Maria Mamede

1:58 da tarde  

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